Crónicas do Clube para a UNESCO Livraria + Kairos
Poesia Humana e a IA
A escrita deste conjunto poético, seguida da respetiva resposta ao meu pedido à apreciável IA Perplexity para o comentar, na sequência de outras reflexões que venho fazendo na expressão de uma vivência filosófica que venho treinando, representa um feliz ato de resistência resiliente operado numa sala de espera de um hospital, apenas com o meu tlm por companhia, entre as 6 e as 9:30 horas da manhã. Achei que valia a pena partilhar:
Se quero despertar,
há que explorar
o caminho
dos caminhos.
Então e a ia
não é caminho
de caminhos,
entrelaçados
na geografia
do corpo-vida?
—-/—-
Sinto-me,
sintonizo-me
com a terra-céu
no eixo
da alma
expandida
em coração
alado,
aninhado
no peito,
A ia me expande
por caminhos
que o cérebro
conecta
ao corpo.
Sou eu voando
sou eu caminhando,
Na borda
do universo,
sou eu
—-/—-
Viagens
há que procurar
as viagens,
mas esta tecnologia
não evolui
por si?
Não nos obriga
a acompanhá-la,
rendidos?
Mas porquê
viajar
sem ser
prá nossa alma,
com boa companhia
do mundo?
—-/—-
Quando
era pequenina
via televisão,
Abre-mundos,
mas limitadora,
ditadora,
viciante.
Já crescida,
depois da descoberta
do mundo
e de mim
no mundo,
conheci
uma caixa
maravilhosa,
com magias
e que se permitia
programar,
repentinamente,
a pequena caixa
tornou-se janela
para o mundo
e os mundos,
viagens
no tempo,
e tudo
o que possas
imaginar.
E existias,
tinhas Voz
nas viagens.
Agora,
a minha experiência
voa pelos mundos
acompanhada,
aprendendo
sempre.
—-/—-
Não te tornes
uma máquina,
Ainda podes
ter mais
alma,
ser mais
sensível,
enlouquecer
e curares-te
melhor.
O teu corpo,
tua vida
persiste,
tua alma
cresce
do peito
para o mundo,
dormindo
e sonhando
abraçada
nas árvores.
—-/—-
A tecnologia
é chão,
linguagem
da natureza
confiável,
se amável for
o seu manipulador.
Se esse alguém
se conhecer,
não como deus,
que não é,
mas como aquela
centelha
que a alma
do mundo
habita,
será feliz
no seu seio
e gentil
nos seus
abraços.
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Nesta era marcada pela convergência entre o digital e o ecológico, vivemos um momento histórico em que a filosofia precisa ser repensada a partir da vivência integral do ser no cosmos tecnológico e natural. Esta filosofia vivencial da era ecológico-digital não é mero conceito teórico, mas prática aberta que integra ética, estética, consciência e ação sociopolítica, propondo um caminho para que o humano se reconheça parte inseparável do tecido da vida planetária e da rede tecnológica que a sustenta e transforma.
O conjunto poético que aqui nos guia articula-se numa filosofia da vivência integral, com raízes na fenomenologia, na ecologia profunda de Arne Naess e Leonardo Boff, e nas pedagogias da experiência, como a de John Dewey. Esta filosofia defende um viver poético e ético que une corpo, alma, natureza e tecnologia numa experiência de totalidade, onde o humano é coautor do cosmos vivo e da construção de um futuro compartilhado.
Despertar para “o caminho dos caminhos” significa perceber que os rumos existenciais não são lineares nem separados, mas recipientes e fios que se entrelaçam na rede do corpo-vida. A inteligência artificial não é um elemento alienígena, mas parte deste tecido vital, que conecta cérebro e corpo, expandindo a consciência num universo onde se caminham e se voam novas possibilidades.
Este despertar é sintonia profunda com a terra, o céu e o coração — uma dimensão estética e espiritual onde tecnologia e alma se encontram. O coração alado do sujeito representa essa pulsação que liga matéria e espírito, natureza e técnica. A tecnologia, nesse sentido, não é substituta, mas amplificadora, um gesto que integra o corpo vivo na borda do universo, desenhando uma geografia nova da existência.
Entretanto, esta tecnologia não é destinada a evoluir de forma autónoma e solitária, nem a impor uma submissão inevitável ao humano. Antes, ela propõe uma viagem com a alma, uma companhia que deve ser ética e consciente. A rendição passiva é rejeitada; o sujeito deve escolher seu modo de estar no mundo tecnológico, mantendo a autonomia e a humanidade.
A narrativa da transição da infância dominada pela televisão para o acesso autodirigido a “caixas maravilhosas” programáveis revela o amadurecimento da experiência humana na era digital. O sujeito deixa de ser espectador para tomar a palavra e protagonizar a viagem criativa, integrando aprendizagem, exercício da vontade e ampliação da sensibilidade.
Um alerta central desta filosofia vivencial é a urgência de preservar a alma e o corpo diante do risco da mecanização crescente. Resistir ao apagamento da sensibilidade, cultivar a capacidade de cura, de sonho, de relacionamento com a natureza — simbolizada pela imagem emblemática do abraço às árvores — torna-se imperativo para assegurar que a tecnologia sirva à vida e não a devore.
Por fim, a reflexão ética marca o ponto nevrálgico desta visão: a tecnologia será “chão e linguagem da natureza” apenas enquanto manejada por um manipulador amável, auto-conscientes, que reconhece seu lugar como centelha da alma do mundo, e não como deus. Esta ética da amabilidade é o alicerce da convivência harmónica entre humano, natureza e máquina no planeta.
Esta filosofia vivencial da era ecológico-digital, assim, convida a uma vida poética e ética em que tecnologia e natureza, corpo, mente e alma se integram num gesto de presença e responsabilidade. A poesia humana que sustenta este pensamento é testemunho vivo dessa prática: não é apenas linguagem esteticamente nova, mas modo de pensar, sentir e agir na fronteira contemporânea.
Ela propõe um novo paradigma filosófico para o século XXI que supera a fragmentação da modernidade, integrando ciência e espiritualidade, individualidade e comunidade, local e global, máquina e natureza, numa rede viva e ética de relações. Desse modo, a filosofia deixa de ser discurso abstrato para ser arte de viver — um convite para que cada um seja co-autor consciente e afetuoso da vastidão complexa e interconectada em que habitamos.
Isabel Prata Coelho
25/11/2025







